A Cultura do Palácio é a designação da unidade temática de HCA que abrange o período da história cultural e artística europeia desde o princípio do século XV aos finais do século XVI. Em termos estilísticos, este período cobre o Renascimento e o Maneirismo. Contudo, não se trata apenas de uma abordagem dos estilos artísticos. O programa da disciplina procura chamar a atenção para as grandes transformações culturais (e mentais) que se operaram na época, sobretudo das elites políticas e intelectuais, e as mudanças do seu gosto e das técnicas no campo das artes.
Renascimento: foi uma revolução cultural?
Eugénio Garin escreveu um livro em que propunha abordar o Renascimento como um fenómeno de revolução cultural, em vasta escala, iniciado em Itália. Hodiernamente, esta ideia caiu em desuso, pois parece mais aos historiadores que os progressos alcançados neste período (séculos XV e XVI) se devem a um conjunto gradual de mudanças ocorridas na Europa em geral, e em Itália em particular, o que permitu o eclodir, num dado momento, das produções culturais e artísticas que chamamos de Renascimento. Assim, será possível compreender as obras de Dante, de Boccaccio, de Giotto ou mesmo a família Pisano, antes do tempo formal do Renascimento. Renascimento ou Renascimentos?
Esta questão relaciona-se com uma outra, colocada por alguns historiadores da arte e iconógrafos, e com os quais concordamos: artistas como Giotto ou os Pisano são muitas vezes qulaificados, dos pontos de vista técnico e estilístico, como proto-renascentistas, dado apresentarem, de forma sistemática na sua obra, características que anunciavam a essência de algumas temáticas próprias do renascimento.
Renascimento: só em Itália?
H. W. Janson na sua já clássica História da Arte colocou muito bem a questão da geografia do renascimento, no início do capítulo dedicado a este período artístico, onde se refere à comparação com o gótico final e à situação da pintura flamenga no século XV. De facto, embora a recolha de elementos formais e temáticos da antiguidade romana levada a cabo pelos artistas italianos seja um facto sui generis, a verdade é que os flamengos buscam já, no século XV e a partir, sensivelmente de J. van Eyck, soluções formais e técnicas que revelam um espírito humanista e de conquista da realidade, patente na técnica descritiva ao pormenor, na individualização dos rostos, no retrato psicológico ou na representação das perspectivas linear e aérea. Este facto leva-nos a pensar que a categoria "renascimento", aplicada às artes e sem o espartilho do revivalismo clássico, pode abranger mais do que a península itálica. Como Rio de Carvalho lhe chamou, não sei se de forma pioneira, a pintura flamenga quatrocentista constituiu uma via alternativa ao renascimento italiano, e pode muito bem ser estudada paralelamente a este. Contudo, os autores do programa de HCA não viram as coisas deste modo e optaram por incluí-la, simplesmente, na arte do gótico final. Na opinião de Manuel C. Mendes Atanázio, pelas mesmas razões apontadas, a arquitectura manuelina poderia também ser encarada como uma solução formal alternativa ao renascimento, no primeiro quartel do século XVI em Portugal.
Sobre estes assuntos ver:
- E. Panofsky. 1981. Renascimento e Renascimentos na Arte Ocidental. Lisboa: Presença.
- H. W. Janson. 1984. (3ª ed.) História da Arte. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
- M. C. Mendes Atanázio. 1984. A Arte do Manuelino. Lisboa: Presença.